Segundo o Kama Sutra, existem cerca de 484 zonas erógenas conhecidas no corpo humano, entre as quais, a língua. O que pouco se sabe – mas muito se sente – é que esse órgão tão repleto de terminações nervosas não é bom apenas no contato direto. Na cama, as palavras também têm um papel extremamente essencial: além de excitantes, são um eficiente termômetro do prazer e ajudam a demarcar alguns limites. Portanto, antes que os engraçadinhos de plantão digam que, entre lençóis, existem coisas melhores para fazer com a boca do que falar, é importante saber que o diálogo na cama é fundamental para um bom desempenho, dentro e fora dela.
Mesmo com tantos benefícios, muita gente ainda se sente acanhada em soltar o verbo. "Eu não falava quase nada, mas um ex-namorado me desinibiu. Antes, ficava só no 'ai, meu Deus' e 'que dedinho é esse, hein?'", confessa a secretária Myriam Soares. "O mais engraçado é que ele era a criatura mais certinha da face da Terra, daqueles advogados engravatados, seriíssimos", lembra. A surpresa de ver o rapaz se revelando na cama foi crucial para que ela também se rendesse aos apelos do sexo verbal. "Era uma maravilha. Como demoramos um pouco a ir para a cama, já tínhamos criado alguma intimidade quando aconteceu. Logo na primeira noite, ele arrancou minha roupa, me pegou de jeito e me disse uma porção daquelas baixarias que todo mundo gosta de ouvir. Fiquei excitadíssima!", conta. Hoje, para ela, um homem bom de cama tem que ser bom de lábia. "Nisso meu ex foi inesquecível", afirma.
Na cama, os assuntos em pauta são os mais diversos. A "scort-girl" paulistana Nana, há sete anos atendente de um sex-phone, garante que não há discurso pronto para agradar a homens ou mulheres. "Mas a maioria deles prefere ouvir coisas mais fortes, palavrões, xingamentos. Eles também gostam de se sentir potentes, absolutos, os reis do mundo", revela. Já as mulheres, de acordo com Nana, se excitam geralmente com palavras mais leves, embora algumas também curtam algo mais hardcore. "Dizer para uma mulher que ela é bonita e ir aguçando a sua sensualidade é deixá-la louca", garante. É o caso da professora Juliana Garzon, que considera o romantismo do namorado sua ferramenta mais excitante. "Quando chegamos juntos ao orgasmo, ele me abraça e quase gozo de novo quando ele me diz no ouvido, bem ofegante, que me ama e que sou a mulher mais maravilhosa do mundo", diz.
Mas como sexo se resume, basicamente, a preferências pessoais, o que deixa alguns subindo pelas paredes, para outros é um balde de gelo. Na opinião da jornalista Anne Moreira, ouvir um 'eu te amo' ou "você é o amor da minha vida" no meio de um picante rala-e-rola é o que há de mais desestimulante. "Muito guti-guti na cama é o fim. Acho que gosto de pensar que estamos lá pelo prazer e não pelo amor", declara. Segundo o psiquiatra e terapeuta sexual Moacir Costa, isso pode ser sinal de medo de compromisso. Ele diz que, para grande parte das pessoas, expressões de amor possuem um peso destoante em relação ao clima da hora do sexo. "As expressões faladas durante a relação são absolutamente espontâneas. E tudo isso está ligado às fantasias sexuais, que só são liberadas na cama", explica.
Portanto, se uma declaração romântica tradicional não combina com expressões do tipo "cachorra" ou "safado", não há motivo para culpa: entre quatro paredes até a mais chula das palavras pode ser uma expressão de carinho. "Quando os dois estão na mesma sintonia, vale tudo. Não há nada mais gostoso do que perceber que o outro também está sentindo prazer com os nossos desejos e entrando na brincadeira. Mas, depois de tudo, dizer um 'eu te amo' pode ser uma forma muito legal de dizer que tudo foi ótimo", comenta Dr. Moacir. Para ele, a cumplicidade ainda é um dos fatores mais prazerosos do sexo.
Mas para alcançar a tal cumplicidade é preciso, além de convivência, muito papo fora da cama. Escancarar de primeira as taras verbais pode ter conseqüências desastrosas. O economista Flávio Furtado foi ao motel com a nova namorada e descobriu que, para as fantasias da moça, nem o céu era o limite. "Estávamos lá, no maior amasso, aquela doideira toda. Em meio a gemidos e coisas do tipo 'vai', 'vem' e outras, ela me vira e dispara: 'vai com tudo, meu homem de Krypton'. Tive uma crise de riso na mesma hora e só parei uns 20 minutos depois", lembra. Mas errar a mão, ou melhor, a língua, não significa perder uma ótima oportunidade de ficar calada. Segundo o Dr. Moacir, o silêncio é ainda mais desanimador do que qualquer furo. "Essa quietação, essa mudez que lembra um funeral, pode ser extremamente destrutiva para o casal. A comunicação implica em aprendizado e em conhecimento das preferências do parceiro. E como o sexo é uma atividade a dois, isso significa aprimoramento sexual", garante.
Para não deixar que o rangido da cama seja o único som do seu quarto de casal, a "scort-girl" Nana dá algumas dicas. "Ler bons contos eróticos para se familiarizar com a linguagem é ótimo", recomenda. O sexo por telefone também é um bom começo para se soltar. "É sempre mais fácil se desinibir à distância", comenta. E não economize nos adjetivos. "Não diga 'a minha bundinha', somente. Diga 'a minha bundinha gostosa' ou 'os seus braços fortes'", orienta Nana. Para finalizar, o Dr. Moacir lembra que o mais importante nos diálogos sexuais é sentir o grau de receptividade do parceiro. "Falar sobre fantasias sexuais pode ser um estímulo ou um bloqueio. Os limites e vontades do outro devem ser respeitados e, para isso, nada melhor do que uma boa conversa", finaliza.
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